Capítulo III - O meu lugar
Quando a agressão carimbada pelos cinco dedos de mamãe, passou a existir na forma de ais, pensei em caminhar pelo longo corredor da casa que dava para a cozinha. Ainda cheguei a passar pelos quadros da parede, porém, tive a surpresa de ver Joana estatizada na sua pior forma.
- O que está fazendo, Júlia?
- Não é da sua conta! Você está me espionando agora?
- Isso não é da sua conta – disse ironizando.
- Dá pra sair da minha frente, por favor, por que eu preciso ir para o meu quarto.
- Só vou sair quando você me disser o que estava fazendo atrás da porta.
- Ah... Eu só estava...
- Escutado atrás da porta. Quem diria, que coisa feia, uma moça que dá moral a todo mundo escutando atrás da porta.
- E quem é você pra falar de mim, hein? Que atitudes foram essas que você cometeu pra se achar melhor do que eu? Que eu saiba nada do que você faz é louvável, só atrapalha a vida de todos e no fim dá uma de santa. Agora sai da minha frente.
Bati a porta do quarto com força. Quando não mais pude guardar as lágrimas, elas se puseram a cair sobre o meu rosto, assim como caem as gotas de sangue de uma ferida. Tal ferida, não se contentando, se multiplicou em várias e o que era uma simples neblina de pranto se transformou numa gigantesca tempestade.
É verdade que ser jovem é ter uma promíscua vida de arrebatadores conflitos. Mas, a razão disso é, que são eles os professores, os mestres, os dogmáticos doutrinadores de quem se sente isolado e não tem a sorte de encontrar alguém que lhe ensine a viver sem passar pelo sofrimento.
Nada mais justo para mim, do que ter um lugar onde pudesse guardar lembranças, mágoas, dores e também alegrias. O quarto em que dormia era bem mais do que um simples ambiente de descanso, era um mundo que só a mim pertencia, pois não cabia a ninguém tentar entendê-lo.
Com o tempo, comprei por livre e espontânea vontade móveis novos, para guardar o grande acervo de livros da minha coleção. Sobre uma das estantes ficava uma pequena televisão e uma máquina de escrever que havia ganhado de presente de mamãe no meu último aniversário. A cama ao lado da mesa de estudos trajava uma longa coxa azul, que trazia nas bordas um bordado de renda desenhado por mamãe. O guarda-roupa feito de uma madeira nobre se estendia até o teto com desenhos feitos a mão. As paredes brancas, por mais estreitas que fossem não apresentavam ao ambiente um olhar de pequenez. Nelas estavam fotografias antigas da família. Dentre elas, uma se destacava por apresentar a imagem desconhecida de um homem com o rosto quase desfigurado pelo tempo. Nem eu, nem Joana sabíamos quem era aquele senhor, apesar das tantas vezes que buscamos saber.
Muito bom, gostei dos detalhes dos espaços da casa, móveis contados de outra forma genial e também dos diálogos familiares...
ResponderExcluirArnaldo Ricardo do Nascimento
Bibliotecário da FECLESC