16 de ago. de 2011

A problemática do ENEM como mecanismo único para ingresso na Universidade

imageA problemática do ENEM como mecanismo único para ingresso na Universidade
Apesar de não ser especialista em processos avaliativos, pretendo através do presente artigo de opinião, expressar meu pensamento sobre o ENEM como processo único para ingresso na Universidade Pública brasileira e as possíveis implicações/consequências de tal mecanismo.
Como é do conhecimento de todos, a partir do ano de 2010, para o ano letivo de 2011, a Universidade Federal do Ceará (UFC) foi uma das Universidades Públicas brasileiras a adotar o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como forma exclusiva para ingresso direto em seus cursos de graduação (não estamos levando em conta aqui outros processos de ingresso, como transferência facultativa externa e interna, admissão de graduados, mudança de curso etc.). Como também é sabido por todos, antes da adoção do ENEM, a UFC utilizava um vestibular tradicional, com duas etapas, sendo que a primeira era composta por uma prova de conhecimentos gerais (66 questões objetivas distribuídas entre as disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, História, Geografia, Física, Química, Biologia e Língua Estrangeira) e a segunda era composta por uma prova de redação e duas provas específicas dissertativas de acordo com o curso de escolha do candidato. Assim, por exemplo, o candidato que optasse pelo curso de Arquitetura e Urbanismo / Bacharelado, deveria realizar na segunda fase do vestibular uma prova dissertativa de História e uma prova dissertativa de Física, com 8 questões cada uma, além, é claro, da prova de Redação, obrigatória para qualquer curso. Já o ENEM pretende avaliar o egresso do Ensino Médio de forma global em 4 áreas do conhecimento: Linguagens, Códigos e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias; e Ciências da Natureza e suas Tecnologias, além da prova de Redação.
A meu ver, o ENEM é uma boa forma de avaliar o nível de conhecimento do egresso do Ensino Médio, apesar de se constituir em uma prova extensa e muito exaustiva para a maioria dos estudantes. Sua proposta de verificar o nível de raciocínio e criticidade do estudante é bastante válida, já que, hoje em dia, não é mais aceitável um tipo de conhecimento apenas memorizado e sem aplicação direta na vida prática. Porém, em minha opinião, não é um mecanismo ideal para determinar se uma pessoa está apta ou não a cursar uma determinada graduação. Reparemos que em seu antigo vestibular, a UFC priorizava que o candidato dominasse certos conhecimentos que fossem ao menos assemelhados com aqueles a serem desenvolvidos em seu curso de graduação. No exemplo citado, o candidato ao curso de Arquitetura e Urbanismo / Bacharelado teria de dominar conhecimentos gerais em todas as disciplinas e conhecimentos específicos de Física e História, além de também realizar um teste de habilidade específica que procurasse demonstrar os “talentos” do estudante para, por exemplo, a prática do desenho arquitetônico, presente em inúmeras disciplinas do curso, do início ao fim. Hoje, com o ENEM, o estudante só precisa ter alcançado uma nota global suficientemente alta para ingressar no curso pretendido, o que, em meu pensamento, poderá ocasionar no ingresso de alunos imaturos e não vocacionados para o curso de graduação a que pretendem.
Racionemos juntos: você acha correto que uma pessoa que tenha alcançado ótimo desempenho em Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e um desempenho não tão bom assim em Matemática e suas Tecnologias e nem saiba desenhar uma árvore ingresse na Universidade para cursar Engenharia Civil / Bacharelado? Bem, ela precisará fazer cálculos complexíssimos do primeiro ao último semestres de seu curso e também trabalhará com muitas plantas e desenhos o tempo todo. E o que você acha de uma pessoa que é ótima em Ciências da Natureza e suas Tecnologias, mas não sabe uma palavra em inglês, ingressar no curso de Letras-Inglês / Licenciatura? Lembremos que ela precisará ler textos teóricos e literários de alta complexidade em Língua Inglesa, além de conceber trabalhos também nesta língua. E você se consultaria com um médico sabendo que, no Ensino Médio, ele fora um péssimo aluno em Biologia e Química, mas mesmo assim conseguira ingressar em Medicina / Bacharelado? A Biologia e a Química são de extrema importância na formação de qualquer profissional de saúde, já estudar o corpo
humano e suas doenças e o efeitos dos diversos medicamentos no organismo são assuntos pautados em princípios básicos da Biologia Humana e da Química Orgânica. Mas, através do ENEM como forma de ingresso, tais hipóteses são possíveis, já que o estudante é analisado em seu aprendizado global (o que é bom), mas não é avaliado quanto às suas potencialidades para cursar uma determinada graduação (o que é ruim). Este mecanismo pode, a curto prazo, aumentar o número de estudantes frustrados e descontentes com seu curso de graduação e, o que é pior, injetar no mercado de trabalho profissionais sem a mínima vocação para a profissão na qual estão engajados.
E a mim não adianta dizer que o aluno de Ensino Médio tem maturidade para escolher sua profissão, porque a verdade é que a maioria não tem nem noção do que quer fazer pelo resto de sua vida. A meu ver, o melhor caminho era que o estudante se guiasse pelas disciplinas com as quais tem mais afeição para escolher as possíveis graduações nas quais desejasse ingressar. Ainda assim, é difícil fazer uma escolha certa, já que cursar uma graduação é uma coisa e exercer uma profissão por toda a vida é outra bem diferente. Tudo depende de muita maturidade que a maioria dos jovens brasileiros não tem e nem é incentivada a ter. O que vemos em muitas famílias são pais que querem que seus filhos sigam profissões que “dêem dinheiro” (preferencialmente Direito ou Medicina) e esqueçam o sonho de serem felizes. No futuro, teremos adultos e “profissionais” cada vez mais infelizes consigo mesmos e precisando de terapia do autoconhecimento.
Mas qual seria, então, o mecanismo ideal para o ingresso do jovem na Universidade? Acredito que à perfeição nunca vamos chegar, em nenhum lugar do mundo, com relação a esta questão, já que somente cada um é que sabe, por si mesmo, o que quer fazer da vida e para o quê tem habilidades. Mas vamos imaginar que a escola brasileira, pública ou privada, fosse uma das melhores do mundo e que já avaliasse cada estudante desde sua tenra idade quanto às suas habilidades/talentos artísticos, intelectuais e esportivos. Esta escola teria como produzir de cada aluno um currículo que lhe revelasse, com bom índice de acerto, quais as suas potencialidades e vocações a serem desenvolvidas na Universidade. Então, numa articulação Escola-Universidade, a escola enviaria para as diversas Universidades do Estado o currículo de todos os seus alunos e a Universidade diria ao aluno para qual/quais curso(s) ele teria vocação. Assim, o aluno faria um processo seletivo para um dos cursos indicados pela Universidade, mas, se desejasse, poderia fazer seleção para qualquer outro curso que quisesse, pois a última palavra quanto às suas habilidades profissionais sempre seria sua. O processo seletivo deveria constituir-se em uma prova de conhecimentos gerais (primeira fase) e uma prova de conhecimento específicos e redação (segunda fase) mais um teste de habilidade específica para os cursos em que tal procedimento fosse julgado necessário.
Atualmente, até onde eu saiba, a Universidade Estadual do Ceará (UECE) é a única instituição de ensino superior do Estado que realiza provas de conhecimentos específicos, além de prova de conhecimentos gerais. Quanto ao exame de habilidade específica, este é realizado na Universidade Estadual do Ceará (UECE) para os cursos de Música (habilitação em Licenciatura ou Bacharelado em Piano ou Composição ou Flauta Transversa ou Saxofone), na Universidade de Fortaleza (Unifor) para o curso de Arquitetura e Urbanismo / Bacharelado e no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) para os cursos de Licenciatura em Artes Cênicas ou em Artes Plásticas.
Francisco Elton Martins de Souza
Estudante do 6º período de Letras – Língua Portuguesa / Licenciatura pela Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central da Universidade Estadual do Ceará (FECLESC / UECE) – Campus de Quixadá

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